sábado, junho 14, 2025
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São Mateus acumula 366 casos de violência doméstica e dois homicídios contra mulheres em 2025

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Por

Claudio Caterinque

Repórter

 

No fim do mês ado, o assassinato de Quézia Maciel a facadas causou comoção em São Mateus. O caso da jovem, de 23 anos, é mais um de violência registrado contra mulher em São Mateus neste ano. Apontado pela polícia como autor do crime, um homem identificado como Rafael Medeiros Araújo foi preso na Região dos Quilômetros, após ar dias se escondendo em área de mata, conforme registrado em boletim de ocorrência da Polícia Militar.

Existem alguns áudios que são atribuídos ao acusado em que ele estaria tentando justificar o assassinato como sendo resultado de “fofocas” envolvendo o nome dele e da colega de trabalho. No áudio, Rafael estaria confessando que não teria ficado satisfeito com a evolução dessas possíveis fofocas, que no dia do crime teria saído antes da colega, ido para casa, colocado uma faca na cintura, a esperado no local conhecido como Ladeira do Colina e esfaqueado a vítima no meio da rua. O crime ocorreu por volta das 21h do dia 28 de maio.

O caso ocorrido em São Mateus ilustra toda a covardia que é comum nesses tipos de crimes. Dados do de Monitoramento da Violência Contra a Mulher, ferramenta da Secretaria Estadual de Segurança Pública e Defesa Social (Sesp), mostram que em São Mateus haviam sido registrados 366 casos de violência doméstica e dois homicídios contra mulheres até terça-feira (10). Os números revelam ainda que a maioria dos casos envolve a Lei Maria da Penha e ocorre no horário de almoço e à noite.

Além da morte de Quézia Maciel, no dia 28 de maio, o segundo homicídio contra mulher em São Mateus ocorreu em fevereiro, no Balneário de Guriri. O corpo da vítima foi achado em avançado estado de decomposição em um terreno baldio na Rua Sete, lado sul. Na época, a perícia da Polícia Civil identificou nove perfurações de faca no corpo da vítima. Até o fechamento desta edição, nenhum suspeito havia sido preso.

 

Promotora explica diferenças entre

homicídio de mulher e feminicídio

 

Coordenadora do Subnúcleo São Mateus, Região IV, do Núcleo de Enfrentamento às Violências de Gênero em Defesa dos Direitos das Mulheres (Nevid), órgão do Ministério Público do Espírito Santo (MPES), a promotora de Justiça Isabel Mendes Lomeu explica as diferenças entre homicídio de mulher e feminicídio.

Em São Mateus, um dos locais de recebimento de denúncias de violência doméstica é o Ministério Público Estadual, onde funciona o subnúcleo regional do Núcleo de Enfrentamento às Violências de Gênero em Defesa dos Direitos das Mulheres (Nevid), e que tem a promotora de Justiça Isabel Mendes Lomeu como coordenadora. Foto: Arquivo TC Digital

Em entrevista à Rede TC de Comunicações, ela disse que a diferença técnica se refere basicamente à motivação do crime. “O Código Penal trata o feminicídio como a morte violenta de uma mulher por motivo de gênero. Então, é previsto uma pena maior em relação a um homicídio [de mulher], que não tem essas características” – frisa.

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Segundo ela, para se caracterizar um feminicídio, é preciso que haja razões fundadas na condição da vítima ser do sexo feminino. “A gente considera que o crime foi cometido por razões, pela condição do sexo feminino da vítima, que é quando ele se encaixa numa situação de violência doméstica e familiar ou quando há o menosprezo ou discriminação à condição de mulher”.

Já o homicídio de mulher é quando não existe essa relação entre o autor e a vítima. “Uma situação mais ampla, que requer uma maior investigação e interpretação. A gente tem uma morte de mulher, ou seja, um homicídio de mulher, que não se caracteriza com a questão de gênero. Podemos trazer a seguinte situação hipotética: um assassino, por algum motivo, dívida ou tráfico, adentra numa residência em que há homens e mulheres e atira indiscriminadamente contra as vítimas, mas atinge só uma mulher [além de homens]. Tudo indica que ele não agiu com violência de gênero. Pelo exemplo, ele não quis matar essa mulher pela condição de ela ser do sexo feminino. Ele tinha outras motivações”.

Fortalecimento das redes de denúncias

ajuda no combate, avalia Isabel Lomeu

Os dados do da Sesp indicam que os registros de casos de violência contra a mulher vêm aumentando nos últimos anos – conforme demonstram os gráficos publicados nesta Reportagem. A promotora de Justiça Isabel Mendes Lomeu afirma que esse é um fenômeno complexo e que a explicação não é simples. Segundo ela, de um lado, existem sim mais mulheres denunciando. Ela frisa que isso é resultado também das políticas públicas de conscientização, divulgação da Lei Maria da Penha e fortalecimento das redes de denúncia e prevenção.

“Isso vem de um processo que se intensificou na pandemia [do coronavírus, nos anos de 2020 a 2022], quando houve aumento significativo desses dados. Então houve a necessidade de divulgação de canais remotos, de denúncia, e isso tudo fortaleceu muitas mulheres a denunciarem, por exemplo, violências que já vinham sofrendo há muito tempo”.

Por outro lado, segundo a coordenadora do subnúcleo do Nevid em São Mateus, há sim aumento dos casos. “Então, a gente não pode precisar se é maior procura da vítima ou se tem também um crescimento da violência. Fato é: estamos nos deparando com números crescentes e o enfrentamento, a persecução penal desses crimes, tem sido intensificado, até pela melhor estruturação do Estado com esse objetivo”.

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A promotora afirma ainda que outro ponto positivo é o trabalho das polícias e que a população em si também ou a denunciar mais. “ou a reconhecer essa situação, o que é um ponto favorável ao enfrentamento desse tipo de violência”.

Quando a mulher deve denunciar

e quais os principais sinais que

indicam que o homem é violento

 A promotora de Justiça Isabel Mendes Lomeu explica também quais os sinais que indicam que um homem pode ser violento e também quando denunciar qualquer tipo de violência contra mulher.

“A mulher deve denunciar desde os primeiros sinais de violência. É um erro muito comum, que nós, da promotoria de justiça, vislumbramos com frequência nos processos criminais: é a mulher que não reconhece esses primeiros sinais”.

Ela indica quais são esses primeiros sinais. “Muitas vítimas acreditam que só a violência que deixa marcas, a física, ou uma ameaça de morte, são íveis de denúncia. Esse talvez seja o grande dificultador de uma atenção maior das autoridades em favor dessa mulher”.

E continua: “Xingamentos, ciúmes doentios, controle excessivo, isolamento da mulher em relação a amizades familiares, controle excessivo da rotina, interferência de forma excessiva impedindo que essa mulher tenha ou desenvolva suas atividades laborais, destruição de objetos sexuais, controle econômico, coerção sexual, são alguns sinais comuns”.

A promotora afirma ainda que outra situação é, quando a mulher casada é obrigada ou coagida a manter atos sexuais contra a sua vontade. “Tudo isso são situações que, muitas vezes, não são reconhecidas pela vítima como violência, mas já configuram crimes e pode propiciar uma intervenção precoce da polícia, uma medida protetiva de urgência em favor dessa mulher”.

De acordo com Isabel Lomeu, a violência doméstica percorre um ciclo. “Começa com esses primeiros sinais e vai se robustecendo, se tornando mais grave. Até que, muitas vezes, o agressor entra na chamada, entre aspas, lua de mel, para convencer essa mulher que essas violências não irão voltar mais, e ela, ao invés de percorrer o caminho da denúncia, segue no relacionamento, até que esse ciclo não é rompido e pode evoluir para um feminicídio”.

Descumprimento de

medidas protetivas

O da Sesp mostra também que, apesar da concessão de medidas protetivas pelas delegacias especializadas e pela Justiça, elas ainda são descumpridas. E esse descumprimento vem aumentando no Espírito Santo. O Estado já tem 1.181 registros de descumprimento dessas medidas em 2025. Nos três anos anteriores, houve um nítido aumento, começando com 1.637 em 2022, 1.939 em 2023 e 2.306 no ano ado.

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Em São Mateus não é diferente. Somente nos cinco primeiros meses deste ano –somando os 10 primeiros dias de junho– já são 22 registros desta natureza, mesma quantidade que houve de janeiro a dezembro de 2022. Em 2023 foram 25 descumprimentos, número que subiu para 40 no ano ado.

Ainda assim, a coordenadora do subnúcleo do Nevid, Isabel Lomeu, explica que o poder público tem o dever de proteger essas mulheres com medida protetiva de urgência fortalecendo as redes de atendimento, incluindo todos os órgãos que têm a obrigação e podem acolher a vítima.

“Não só o Ministério Público, polícias Civil e Militar, Defensoria Pública, mas também [secretarias de] Assistência Social, Saúde, que são órgãos captadores de situações de violência e que têm a obrigação de notificar. Então, são meios que, quanto mais fortes e unidos, mais eles vão proteger”.

Outra ferramenta que a promotora destaca é a Patrulha Maria da Penha, da Polícia Militar. “É um serviço muito efetivo, inclusive a cidade de São Mateus conta com a patrulha que vai estar monitorando aquela mulher, visitando, para saber se ela está sendo abordada. Infelizmente, algumas mulheres dispensam esse serviço e muitas vezes ele não tem a abrangência e a quantidade de pessoal suficiente para monitorar de forma satisfatória. Então, o nosso grande objetivo é fortalecer essa rede de proteção”.

 

Município vem

registrando aumento

em casos de estupros

Outro dado preocupante do de Monitoramento da Violência Contra a Mulher da Sesp é que São Mateus vem registrando um aumento na quantidade de casos envolvendo estupro. Segundo o , em 2022 foram 35 casos, 36 em 2023 e 42 em 2024. Neste ano, até o dia 10 de junho, já haviam nove registros.

A maioria dos casos envolve menores de idade, ou seja, é classificado como estupro de vulnerável, tendo como vítimas crianças com até 12 anos. Outra informação importante é que a maioria dos casos ocorre dentro da própria residência da vítima, conforme o .

Na tentativa de combater esses tipos de caso, o Senado Federal aprovou na terça-feira (10) uma proposta que indica que a idade não deve ser atenuante para diminuir penas em crime de estupro. De acordo com o texto, menores de 21 anos na data do crime ou maiores de 70 anos na data da condenação não terão mais a pena reduzida em caso de condenação por estupro, em razão da idade. O fim do atenuante recebeu aval do Senado e seguiria ainda nesta semana para sanção presidencial.

Foto de destaque: Arquivo TC Digital

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